Crônica de Thais
Matarazzo
(21/11/2009)
Sábado chuvoso em São Paulo, a cidade está vazia devido ao feriado prolongado da sexta-feira, Dia da Consciência Negra.
Às 19 horas me dirigi para o
bairro da Barra Funda, onde se localiza o Memorial da América Latina. Ali, no
auditório Simon Bolívar, a Orquestra Jovem Tom Jobim homenageou a nossa grande
intérprete do choro, Ademilde Fonseca.
Como cheguei cedo e fiquei
esperando no foyer. Não tinha muita gente; não sei a capacidade total do
auditório, mas é bem grande e não lotou, infelizmente. As pessoas não têm conhecimento
do grande destaque musical que é Ademilde Fonseca, sua voz, sua rapidez ao
cantar sem perder uma nota.
O concerto deveria ter começado às
21 horas, mas atrasou 15 minutos. Depois da campainha soar três vezes, os músicos
entraram, se acomodaram com seus instrumentos, o maestro Roberto Sion moveu a
batuta e a orquestra executou três lindos números populares com arranjos
belíssimos, foram eles, Suíte Edu Lobo,
arranjo do maestro Cyro Pereira, 1X0
(Pixinguinha), com arranjo de Roberto Sion e Choro Negro (uma pérola de Paulinho da Viola), com arranjo de
Nelson Ayres. Eu fiquei emocionada, sentir a boa música penetrar pelos ouvidos,
pele, coração é algo tão divino que não tem explicação!
A seguir, chegou o grande
momento, a apresentação de Ademilde Fonseca, entrou ladeada pelo maestro
Roberto e Eymar, sua filha. Estava com um vestido branco muito bonito, muitos
acessórios e joias. Foi copiosamente aplaudida, de princípio brindou o público
com o choro O que vier eu traço
(Alvaiade / Zé Maria), acompanhada pela orquestra. Sucesso de seu extenso repertório.
Do lado esquerdo do palco, havia
uma mesa com seis cadeiras, para lá se dirigiram quatro músicos: flauta,
violão, trombone e pandeiro, acompanharam Ademilde e Eymar em Naquela Mesa (Sérgio Bittencourt) - que
a cantora fez questão de incluir no programa para homenagear Jacob do Bandolim,
uma das grandes legendas do choro.
No início, Ademilde pediu ao
público para desculpá-la por eventuais erros, pois está com 88 anos, além do
que, só houve um ensaio antes do espetáculo. O maestro reconheceu que é muito
pouco, mas isso é um problema administrativo, devendo ser resolvido por
autoridades competentes.
A plateia estava muito tímida,
explica-se, a maioria dos presentes eram amigos ou parentes dos músicos
bolsistas da Orquestra Jovem Tom Jobim. Muitos não conheciam Ademilde. Amavelmente, a Rainha do Choro pediu para que todos cantassem com ela Carinhoso (Pixinguinha / João de Barro),
e assim foi... momento tocante! A moçada ficou cativada.
Ademilde não deixou de ressaltar
que, quando um artista fica velho no Brasil “não serve mais”, as portas da área
cultural se fecham, só importa o que é novo. E que era para todos curtirem
aquele momento, por que podia ser a última vez que ela vinha a São Paulo
cantar. Eu, pelo menos, e muitos como observei, curtirmos sim. O maestro foi de
uma ternura imensa com Ademilde, perdoou todos os erros com um meigo sorriso,
notava-se no seu olhar a satisfação em acompanhá-la no concerto, afinal é fã da
cantora desde criança.
Para terminar cantaram Brasileirinho (Waldir Azevedo), não houve bis, todos foram saindo.
Eu corri para os camarins, depois
da resistência da segurança em deixar os fãs entrarem, consegui adentrar e
tirar “umas chapas” com a Ademilde, uma das minhas cantoras preferidas. Ela foi
toda uma simpatia, agradeceu minhas palavras de exaltação à sua arte.
Fiquei contente por ela vir
cantar em São Paulo. Vim embora feliz da vida, com uma sensação boa de ter
abraçado uma criatura cheia de luz.
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