Personalidades das reuniões do Patteo do Collegio: Sirlei Jaldim (1935 - 2021)

        Estas duas crônicas são uma homenagem à Sirlei Jaldim, uma amiga falecida em 18/10/2021, aos 86 anos. 
    A conheci nas reuniões dos Colecionadores de Antiguidades, no Patteo do Collegio, por volta de 2004 ou 2005.
  Além das reuniões das terças à tarde no Patteo, Sirlei sempre comparecia aos saraus, na Rodas de Choro da Contemporânea, lançamentos dos meus livros, em eventos na Casa de Portugal e outros locais ligados à música, poesia e literatura.
    Vamos relembrá-la!

Um susto na Liberdade!*


Arte: Ulysses Galletti
    
    Uma vez fui convidada pela amiga Sirlei Jaldim para ir a um sarau de poesia e música, no bairro da Liberdade. Na oportunidade, a fadista Conceição de Freitas iria se apresentar com os seus guitarristas. Ela era nossa amiga e fomos prestigiá-la.

Capa do CD da fadista Conceição de Freitas
(Monte, Ilha da Madeira, Portugal, 6/12/1955 - São Paulo, SP, 1º/1/2017)

    O evento começou por volta das 18 horas e estendeu-se até às 22 horas, havia bastante gente para se apresentar. Já estava ficando desesperada para ir embora.
    Havíamos combinado com outras pessoas que na hora de partir, iríamos todos juntos até à estação São Joaquim do Metrô. Dava uns 10 ou 12 minutos de caminhada e a noite estava fria.
    Mas, como sempre acontece, um consegue carona com um, outro com outro, e no fim nosso grupo ficou reduzido a três.
    A rua estava vazia, o vento gelado e a iluminação um horror. Naquela época não tinha carros de aplicativo, a internet de dados era ruim, e não havia um ponto de táxi por perto.
    Munidas de coragem, lá fomos as “três mosqueteiras”. Nunca andei tão depressa na vida.
    Passamos em frente a um conjunto de casas bem antigas, caindo aos pedaços. De repente, a Sirlei resolveu parar porque queria ver melhor os detalhes. Que hora imprópria!
    Respondi que ela poderia voltar outro dia, com calma e “de dia”. Ela insistiu e atravessou a rua. Que maçada!
    Quando ela foi se aproximando de uma das janelas para tirar uma foto com o celular, alguém acendeu a luz e abriu o vidro. A Sirlei deu um pulo e saiu “de carreirinha”. Chegou à estação do Metrô antes de nós!

* Crônica publicada anteriormente no livro Vamos de prosa, poesia e café? (Matarazzo, 2021), de Thais Matarazzo.

Capa do livro "Vamos de prosa, poesia e café?" (Matarazzo, 2021),
de Thais Matarazzo e arte digital de Ulysses Galletti


Visita da cantora Salomé Parísio à reunião dos Colecionadores de Antiguidades
no Patteo do Colégio, em 4/9/2007.
Da esq. para dir., vemos, Salomé, Hugo Giovanelli, Thais Matarazzo
 e Sirlei Jaldim (sentada).
Foto: arquivo Thais Matarazzo


Sarau na Vila Maria Zélia, realizado durante a exposição sobre Carmem Miranda, com o acervo de Hugo Giovanelli.
Da esq. para dir., vemos, Gabriel Gonzaga, Thais Matarazzo, Sirlei Jaldim, Hugo Giovabelli, Vander Loureiro e Luiz Amorim.
Foto: arquivo Thais Matarazzo




Vamos ao Fado, Sirlei?

(Crônica, 7/1/2022)
Thais Matarazzo

Aniversário do programa "Quem somos nós", TV Aberta, 17/1/2010,
 festa ocorrida no Salão Nobre da Casa de Portugal de São Paulo. 
Vemos, da esq. para dir., Thais Matarazzo, Ivany e Manoel Ferreira, os fadistas
Sebastião Manuel e Glória de Lourdes, Sirlei Jaldim, e sua irmã Sarah (em 1º plano).
Fotos: acervo Thais Matarazzo

     Fiquei sabendo do falecimento da Sirlei Jaldim pela amiga Denise Duran no final do ano passado, aconteceu em 18/10/2021.

    Foi somente assim que foi revelada a sua verdadeira idade: 86 anos. A Sirlei nunca revelou sua idade para ninguém, quando não queria falar costumava disfarçar e desviar do assunto.

    Sempre foi uma pessoa ativa, bem disposta e gostava de sair para se divertir. Nos últimos anos, por conta de complicações com a diabetes e problemas de visão, quase não comparecia aos eventos culturais.

    Conversávamos por telefone, Sirlei me telefonema vez ou outra. Recordávamos, com saudades, das reuniões no Patteo do Collegio, das Rodas de Choro da Contemporânea, dos almoços no restaurante Zebrinha após o “choro” aos sábados, dos saraus, dos eventos literários, dos passeios pela cidade com nossos amigos, e das apresentações de Fado. Ah, a música portuguesa tocava profundamente o seu coração.

    Uma vez ela me contou que seu pai era português imigrante e trabalhava como ferroviário. A mãe também era de descendência lusitana. Sirlei e suas outras três irmãs, nasceram e foram criadas no bairro do Bom Retiro, em São Paulo.

    Em seguida, quando a situação financeira dos pais permitiu, adquiriram um terreno na Vila Maria e construíram uma casa. Assim, a família atravessou o rio Tietê para a Zona Norte. Aliás, toda aquela região foi ocupada por imigrantes europeus, principalmente, portugueses.

    Bem jovenzinha, Sirlei começou a trabalhar em escritórios no centro da cidade. Conheceu Augusto, com quem iniciou um relacionamento, e foram viver em uma kitnet na Liberdade. Bairro pelo qual era apaixonada e muito lamentou quando seu companheiro morreu e ela precisou voltar para a casa de sua mãe, que estava doente e precisava de seus cuidados.

    Contava-nos que apreciava frequentar bons restaurantes na cidade, gostava de viajar e se divertir. Morar na região central facilitava suas saídas, pois a infraestrutura de transporte público é ótima.

    Sirlei tinha um temperamento teimoso, quando cismava com alguma coisa fazia valer a sua vontade. Costumava desconversar e não deixava ninguém falar, de tanta atrapalhação.

    Mas, voltemos aos Fados!

    Assim como eu, Sirlei costumava escutar aos finais de semanas os programas de rádio dedicados à comunidade e à música portuguesa, transmitidos por várias emissoras paulistanas, como a Trianon, a 9 de Julho e a Rádio Capital.

    Vira e mexe eram anunciados eventos a serem realizados, muitas vezes com entrada franca, na Casa de Portugal, na Av. Liberdade, que costumava sediar várias festas de aniversários de programas de rádio e televisão da comunidade, saraus, lançamentos de livros, shows com cartazes fadistas internacionais, apresentações e palestras na linda biblioteca da entidade e almoços com ranchos folclóricos. E lá íamos nós!

    Sobre os famosos almoços da comunidade e as apresentações com os excelentes grupos folclóricos, formados por imigrantes lusos e seus descendentes, também comparecemos inúmeras vezes a outros endereços: no salão do santuário Nossa Senhora de Fátima, no Sumaré; na Casa dos Poveiros, na Vila Maria; na Casa do Minho, na Casa Verde; no Clube Português, nas Perdizes, e na Casa Ilha da Madeira, no Mandaqui.

    Nesses momentos, a Sirlei costumava cantar e dançar, com muita alegria!

    Lembro-me que em janeiro de 2010 aconteceu no Salão Nobre da Casa de Portugal o aniversário do programa Quem Somos Nós?, comandado pelos fadistas Sebastião Manuel e Glória de Lourdes. A Sirlei ficou sabendo primeiro e me convidou. Chamamos também o casal Manoel e Ivany Ferreira, nossos amigos do Patteo e moradores do Tatuapé.

    Foi uma excelente apresentação, com guitarras, violões e acordeom (para as músicas folclóricas), cantaram além dos apresentadores, Maria de Lourdes, Conceição de Freitas, Ciça Marinho, Vinicius Rocha, Alexandrina Ribeiro (que faleceria pouco tempo depois), e outros fadistas e cantores que não me recordo no momento.

    O programa Quem Somos Nós?, de 30 minutos de duração, foi filmado e exibido em dois sábados seguidos na TV Aberta. Nas cenas é possível notar a Sirlei se divertindo junto aos artistas, sem nenhuma inibição.

    O tempo passa e vai levando com ele tantas passagens, memórias e pessoas. Fica a saudade e as boas lembranças. A vida é assim!


Aniversário do programa Quem somos nós, TV Aberta, 17/1/2010,
 festa ocorrida no Salão Nobre da Casa de Portugal de São Paulo. 
Foto: acervo Thais Matarazzo

Aniversário do programa Quem somos nós, TV Aberta, 17/1/2010,
 festa ocorrida no Salão Nobre da Casa de Portugal de São Paulo. 
Foto: acervo Thais Matarazzo

O casal Manuel e Ivany Ferreira, e Sirlei Jaldim.
Foto: acervo Thais Matarazzo

A fadista Conceição de Freitas e Thais Matarazzo.
Foto: acervo Thais Matarazzo


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